Não é segredo que empresas grandes e startups têm características muito distintas. Uma corre o risco de ser muito lenta e burocrática, a outra de ser muito desorganizada e caótica.
Assim como empresas, nossa carreira tem maior chance de manifestar certos problemas dependendo do momento.
Gostaria de falar hoje sobre um momento específico: o da gerência. Por gerentes vamos convencionar que se tratam de profissionais na média gestão de empresas, independente do nome que se dá ao cargo. Vou focar aí porque acredito que vale a atenção particular para os danos potenciais de um gerente ruim (apesar de menores que o de um CEO ou diretor, tendem a ser mais difíceis de se identificar).
Bons gerentes conectam a alta gestão com o dia-a-dia da empresa, transformam a estratégia em ações, tem visão de negócio e conhecimento prático da operação, sendo peças cruciais para fazer as coisas acontecerem.
No entanto, sua equipe tende a ter contato restrito com a diretoria e vice-versa. Olhando para o copo meio vazio, o gerente é uma figura que tem poder limitado para grandes decisões, mas independência suficiente para inviabilizar qualquer projeto.
E há quem faça uso desse pequeno poder: o pequeno gerente. Em todo caso, antes de entrar nas questões comportamentais, gostaria de explicar o contexto que enxergo esse perfil se desenvolvendo.
1. O contexto
Em primeiro lugar, vamos combinar que gestão não é fácil. Não é exagero dizer que são necessários alguns anos de prática para se tornar um bom gestor de pessoas.
Nos tempos atuais vejo cada vez mais gerentes serem contratados / promovidos porque tem um conhecimento que a alta gestão não tem. No entanto, não são muitos os diretores dispostos a orientar na gestão: presumem que contrataram alguém para resolver uma questão que não conhecem.
Não quer dizer que não acompanhem, mas em um assunto que não tem conhecimento técnico o diretor tende a atuar de forma binária:
- Reconhece / elogia acontecimentos que considera positivos.
- Reclama / cobra de acontecimentos que considera negativos.
Mas não entrega um feedback estruturado para quem está abaixo. Com isso o gerente é treinado para repetir ou evitar comportamentos, mas não tem suporte para reconhecer efetivamente o que tem a melhorar.
Atuando somente no modelo de reconhecimento / cobrança você trabalha somente dois aspectos: o ego e a auto-estima.
Ou, se preferir: arrogância e insegurança.
(ressalto que estou generalizando alguns vícios mais presentes em certos contextos, é evidente que existem muitos diretores que se dão o trabalho de preparar seus gerentes em maior ou menor grau. Ser gestor de um gestor apresenta seus próprios desafios – uma vez que excesso de acompanhamento pode limitar o espaço e frustrar os envolvidos. O ponto chave aqui é atuar de forma assertiva nos feedbacks com o gerente e não “ficar em cima”)
2. O comportamento
Insegurança e arrogância parecem contraditórios, mas é essa dualidade que está cerne no comportamento do pequeno gerente. É uma criatura altamente defensiva. Como se vicia no reconhecimento – e quer evitar a cobrança – se posiciona com confiança em diversas questões. Tem opinião de sobra acerca do que precisa ser feito diferente.
Mas curiosamente tem receio de promover mudanças. A exposição pode mostrar que não entende tanto quanto diz, e se sente ameaçado com facilidade. Lembre-se: o pequeno gerente é inseguro, perde o sono por conta de uma crítica.
A solução? Controle.
Controlando os processos o gerente está sempre pronto para se defender. Evidentemente, isso leva ao desespero de seus funcionários e terceiros. No entanto, nem sempre são o que chama de um perfil “sacana”, alguns levam o aspecto de controle ao extremo: trabalhando muito sem delegar para os funcionários.
Em algumas empresas isso é suficiente para se manter no cargo. Em pouquíssimas é suficiente para uma promoção. Logo, ficam estagnados. Aos poucos, pode surgir um sentimento de ressentimento e inveja.
(não é a toa que tanto se fala que uma demissão pode ser a melhor coisa da sua carreira. Se você está sofrendo, provavelmente não está conseguindo ser um bom líder)
Seguem mais alguns comportamentos para ajudar a identificar o pequeno gerente:
- Evita compartilhar o que sabe, com receio que fique obsoleto.
- Contrata profissionais low-profile para não se sentir ameaçado.
- Sente-se importante ao criar dependência dele nos processos.
- Se alguma coisa ocorreu na sua área sem sua participação, não foi bem executada.
- Tende a falar mais do que ocorreu no passado do que o que é preciso fazer no futuro. Pode ter muito apego a uma ou duas ocasiões onde foi reconhecido.
- Confunde gestão com controle e cria funcionários paranóicos, com baixa iniciativa.
- Usa a primeira pessoa de forma recorrente (eu fiz / eu corri atrás / eu já disse / etc)
Pensou em alguém que conhece?
3. Soluções?
Como já disse, o pequeno gerente normalmente é consequência de um diretor preguiçoso. Diferente do gerente, o diretor preguiçoso “chegou lá” e não tem mais paciência para entender o que se passa nas áreas sob sua responsabilidade. Quer resultados, não quer chateação.
Ou seja, se o gerente peca pelo excesso de controle, o diretor peca pela omissão. Para ele, o gerente deveria vir pronto de fábrica e não é papel dele capacitar alguém em gestão.
O que me deixa frustrado é que muitos desses gerentes têm potencial (em geral ninguém é reconhecido a toa, salvo em ambientes nepotistas), mas não tiveram boas oportunidades para amadurecer emocionalmente como profissional.
Vivemos em tempos de mudança constante – se por um lado isso nos deixa mais ansiosos – por outro lado nunca se cobrou tanto por mudança nas empresas grandes, inclusive no ambiente (nunca ouvi tanto sobre inteligência emocional no trabalho).
Eu espero que essa mudança se manifeste positivamente e passemos a criar ambientes para tirar o melhor das pessoas e não o pior delas.
Até lá, não deixem de realizar (e solicitar aos seus chefes), feedbacks bem estruturados que ajudem você a se desenvolver como profissional. Ao invés de ouvir coisas como:
“Pare de causar com as outras áreas, resolve logo esse negócio!”
O gerente precisa ouvir:
“Perceba como você foi defensivo nesse momento. Ninguém duvidou da sua competência, estavam apenas questionando se o ponto tal poderia ser feito melhor. Ao invés de explicar a questão, você questionou de volta o interlocutor.”
Esse tipo de conversa é muito mais difícil – para ambas partes – do que elogiar ou criticar. Mas é o que efetivamente nos fará crescer e nos tornar grandes gestores.
Ninguém nasce pronto.
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